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A
mesorregião do Campo das Vertentes é uma das doze
mesorregiões do estado
brasileiro de
Minas Gerais. É formada pela união de 36
municípios agrupados em três
microrregiões. Suas cidades mais importantes são
Barbacena,
São João Del Rei e
Lavras, mas tendo como cidade eixo e pólo regional assim como central a cidade de
São João del Rei.
Microrregiões
Perfil
Esta região tem o nome de
Campo das Vertentes pelo fato deste lugar ser, em termos gerais, o início da
Serra da Mantiqueira, que surge como um descampado no município de
Barbacena, que por sua vez também é chamada de "Campos da Mantiqueira", sendo que nesta região, cujo relevo é formado por
mares de morros, nascem e correm fluentemente muitos rios, que contribuem enormemente para a formação de três grandes bacias, duas de âmbito nacional: O
Paraíba do Sul e o
São Francisco; a de âmbito internacional é o caudaloso
Paraná. Os afluentes do
Paraíba do Sul são o
Rio Pomba que nasce nas proximidades de
Barbacena e o
Rio Paraibuna que nasce na Serra do
Ibitipoca. Na Serra do Ouro Branco, contravertente do Rio Piranga, nascem os afluentes do
Rio Grande, por sua vez importante tributário do
Rio Paraná, o famoso
Rio das Mortes e o
Rio Elvas; no sentido sul-norte nascem os rios que vertem para o
Rio São Francisco; entre
Conselheiro Lafaiete e
Carandaí, na Serra da Noruega nasce o
Rio Paraopeba; em
Pedra do Indaiá, serra do Tamanduá nasce o Rio Lambari e o
Rio Pará nasce em
Desterro.
História
A região começa a ser habitada mesmo antes da descoberta do ouro. Em 1701, Tomé Portes Del Rei, natural de
Taubaté,
Estado de São Paulo, proprietário de uma fazenda às margens do
rio das Mortes, ponto estratégico de acesso às minas de
Caeté,
Sabará e
Ouro Preto, criou e obteve o direito de passagem pelo rio, com o nome de
Porto Real da Passagem. Toma o nome de Ponta do Morro. Com o aparecimento do ouro logo em seguida (1702), o local passou a ser procurado por enorme quantidade de forasteiros. Em dois anos tomava o nome de Arraial Novo. Recém-empossado no governo da capitania de São Paulo e Minas, de passagem pelo
rio das Mortes, Dom Braz Baltazar da Silveira resolveu elevar o Arraial Novo à categoria de vila, a quarta de
Minas Gerais, por ato de 8 de dezembro de 1713, com o nome de
São João Del Rei. Homenageia nesse nome o Rei
Dom João V e o pioneiro da região. Quatro meses depois a vila era elevada à condição de cabeça de
Comarca do Rio das Mortes.
Do início das explorações das jazidas de
ouro até o século XIX a região cresceu desordenadamente formando núcleos populacionais próximos. O [[Arraial Velho depois de emancipado passa a chamar-se
São José do Rio das Mortes, em 1860 toma o nome de São José del Rei e hoje
Tiradentes, parece ter antecipado ao
Porto Real da Passagem na exploração de ouro. Aumentando com rapidez a sua população e a sua produção diversificada,
Tiradentes desmembrou-se de
São João Del Rei em 1718, ultrapassando a sua rival. Durante 71 anos a
Comarca do Rio das Mortes só teve dois municípios: São João Del Rei e
Tiradentes. De
São João Del Rei se emancipa
Campanha em 1789 e de
Tiradentes se emancipa
Itapecerica em 1789,
Barbacena em 1791 e
Conselheiro Lafaiete em 1790. A comarca era enorme. A partir de
Simão Pereira fazia divisa com o
Rio de Janeiro e
São Paulo, seguia no Sudoeste Mineiro pela
Serra da Canastra, divisa com
Goiás (hoje
Triângulo Mineiro) até
Dores do Indaiá na divisa com a Comarca do
Rio das Velhas. Daí seguia em direção Leste até
Mateus Leme. Desse ponto, em direção Norte margem esquerda do
rio Paraopeba e depois a margem direita do
rio Pomba fazendo divisa com a Comarca de
Ouro Preto. De
Cataguases a
Simão Pereira, pela divisa do
Rio de Janeiro fechava o território da Comarca de
Rio das Mortes.
O município de
Tiradentes passou a compor grande parte da Região Metalúrgica, Campo das Vertentes e Alto São Francisco. Municípios como
Conselheiro Lafaiete,
Barbacena,
Itapecerica,
Mateus Leme,
Betim,
Congonhas,
Bonfim,
Oliveira,
Prados e
Resende Costa pertenceram a
Tiradentes. O município de
São João Del Rei atingiu as regiões do
Sul de Minas, e
Zona da Mata Mineira, tendo pertencido a ele as seguintes localidades:
Campanha,
Conceição da Barra,
Carrancas (depois passando a fazer parte de
Lavras, de quem se emancipa),
São Miguel do Cajuru,
Ritápolis,
Bom Sucesso,
Itutinga,
Dores de Campos,
São Sebastião da Vitória,
Ibertioga,
São Tomé das Letras,
Campo Belo,
Lavras,
Três Pontas,
Boa Esperança,
Juiz de Fora,
Rio Preto e
Simão Pereira.
A notoriedade da região no período colonial não é somente em função da produção aurífera e sua densa população, mas em face da variedade de sua produção; capacidade artesanal de sua população. O inglês John Mawe, que visitou Minas em 1809 e que se encantou com a Fazenda da Mantiqueira, nas proximidades de
Barbacena, diz que tudo ali propiciava uma boa experiência agrícola: vasta planície, solo fértil banhado por numerosos cursos d´água podiam dar "200 grãos por 1". O gado ali é baratíssimo. Na Borda do Campo podia-se contemplar um são e viçoso linho, dando corte de três a quadro vezes no ano que era preparado, fiado e tecido em casa. "Na vizinhança de
São João Del Rei (...) há uma singular espécie de pinheiros, de cuja casca transuda muita goma resinosa. (tinta para tecido) A madeira é de um belo vermelho escuro, cheia de nós e excessivamente dura. (...) Cultiva-se um pouco de algodão, que se fia a mão e com o qual se fabrica panos grosseiros para os negros; algumas vezes fazem dele panos mais finos para mesa. As senhoras de
São João Del Rei gostam muito de fazer renda e são consideradas mais cuidadosas com cousas do lar do que as das outras cidades". Por causa de seus vales férteis e de clima ameno as colinas do Campo das Vertentes transformaram-se, ainda no século XVIII, no celeiro de cereais de Minas.
Saint-Hilaire descreve com entusiasmo as mais raras espécies de árvores frutíferas, como pêssego, marmelo, maçã e uva que eram cultivadas na região, além de trigo e centeio. Na memória histórica da
Capitania de Minas Gerais, atribuída ao Engenheiro
José Joaquim da Rocha o narrador diz que no ano de 1778
São João Del Rei, cabeça da comarca, situada em terreno plano e agradável era abundante em caça e gado. Na mesma época reluta o Desembargador João Teixeira que "a
Comarca do Rio das Mortes é a mais vistosa e a mais abundante de toda a capitania em produção de gado, hortaliça e frutos ordinários do País, de forma que além da própria sustentação, provê a toda a capitania de queijo, gados, carne de porco".
Dos municípios da região, São João e São José Del Rei, ficavam mais perto do
Rio de Janeiro, centralizando as atividades do Sul da Capitania; tendo acesso muito próximo ao Caminho Real pôde usufruir das três maiores praças comerciais da Colônia. A comarca, que nunca dependera demasiadamente da mineração, supera com certa galhardia a crise econômica que se abateu sobre a Capitania, principalmente depois de 1780". À medida que se agravavam os sintomas da crise do ouro, foram-se igualmente intensificando as atividades rurais para exportação, especialmente nas vertentes do
Rio Grande, ou seja, banda são-joanense da
Comarca do Rio das Mortes. A banda de
Tiradentes, as vertentes do
São Francisco, voltava-se mais para o abastecimento da própria
Capitania. O
Rio de Janeiro, principalmente após a vinda da
Família Real, passou a importar mais da região. A balança de mercado era favorável à
Comarca do Rio das Mortes, de onde saíam toucinhos, queijos, algodão em rama, tecidos, chapéus de feltro, bois, bestas, galinhas, barras de ouro, açúcar, couros e fumo.
O poderoso senhor Inácio Correa de Pamplona, um dos delatores da
Inconfidência Mineira foi o colonizador do lado franciscano do Campo das Vertentes. De sua luxuosa fazenda em
Lagoa Dourada passa como mestre de campo, no mesmo estilo de seu conterrâneo
Raposo Tavares, a atuar nas cabeceiras do
São Francisco e no
Triângulo Mineiro, na Picada de
Goiás. Dornas Filho diz que Pamplona, em 1806 requereu o prêmio de delação que deveria ser "o hábito de Cristo para si e para seu filho, o padre Inácio; a administração e usufruto dos dízimos da freguesia e Termo de Tamanduá (
Itapecerica) para seus filhos; a administração do subsídio literário das vilas de São José e São João Del Rei; a administração e usufruto da passagem do
São Francisco". Pamplona alegava que suas reivindicações tinham mérito no fato de ter-se empregado no decurso de quarenta anos em franquear e povoar o dito continente, tendo feito seis estradas nele; desfez quilombos, desbaratou o gentio e animou os povos a estabelecerem-se naquele dito continente. Em
Oliveira registra-se também a participação e interferência do inconfidente Padre Toledo e de Pamplona, que antes da delação eram amigos. No povoado de Nossa Senhora de Oliveira encontrava-se o padre Miguel Ribeiro da Silva, benquisto do povo e construía a capela local. Em 1780, padre Toledo, então vigário de São José do Rio das Mortes (
Tiradentes) nomeou um protegido de Pamplona para a função de capelão, o padre Manoel Pacheco Lopes e para o descontentamento do povo, a obra da capela foi interrompida. Trocou-se um sacerdote de virtudes por um padre devasso que humilhou o povo e encobriu seus crimes. Não menos complicada foi a história paroquial de Tamanduá (
Itapecerica). Embora distante da matriz de São José do Rio das Mortes, o padre Toledo queria continuar assistindo aquela freguesia e entrou em luta contra o bispo de
Mariana. Associado a Pamplona o padre Toledo provocou a destituição do padre Gaspar Alves Godim, nomeado pelo bispo de
Mariana.
Depois da
Inconfidência Mineira ocorreu uma verdadeira diáspora em Minas em que os povos das regiões auríferas se espalharam em migrações internas para os extremos da Capitania. A região Sul era tomada quase inteiramente pela Comarca dos Rio das Mortes. No século XIX, especialmente após a Independência, verifica-se uma substancial mudança na região. O crescimento econômico gerou expansão para outras regiões da Província. Contribuiu também com a mudança da fisionomia da região os constantes desmembramentos com criação de novos distritos, municípios e comarcas.
O que caracteriza a economia desenvolvida na região é a policultura, a diversificação da produção adotada na época colonial e mantida no período monárquico. No Campo das Vertentes a plantação de café nunca foi monocultura. O fazendeiro tocava lavoura de café, mas mantinha seu engenho de açúcar, aguardente, moinhos, laticínios, criação de suínos, aves, pomares, artesanato utilitário e indústria caseira. O
Sul de Minas, a
Zona da Mata e a região central de Minas herdaram essa solução e essa vocação campo-vertentista.
Francisco Sales, que nasceu na região em 1863, foi, na
Primeira República, um dos mentores da política do café com leite, que do lado paulista tinha a intenção de privilegiar a monocultura do café e do lado mineiro tendia para a diversificação.
Francisco Sales instalou uma propriedade no município de
Matozinhos, próximo a
Belo Horizonte, onde mantinha uma fazenda mista no estilo da
Normandia. Justifica com consciência os benefícios: "a primeira vantagem da fazenda mista está no estrume gratuito para adubar as plantações. Vem em seguida a possibilidade de rotação de pastos e a produção
in loco do alimento do gado que faz baixar o custo do leite, da manteiga, do toucinho, dos capados e novilhos de corte; avoluma o lucro na venda dos animais e dos produtos da pecuária. A diversidade das produções assegura, sem dúvida, o equilíbrio econômico da empresa: quando uns produtos estão em baixa de cotação, outros estão em alta". Tendo
São João Del Rei como centro a região torna-se o carro-chefe da economia mineira atraindo indústria têxtil, extração mineral com alta tecnologia, com a chegada da
St. John Del Rei Mining Company, em 1830. Em 1860 foi criado o
Banco Almeida Magalhães. Em 1878, com subscrição própria de 4 mil contos de reis levantados por empresários da região, começam as obras da
Estrada de Ferro Oeste de Minas. Com 100 quilômetros de extensão essa ferrovia ligou o sítio onde é hoje a cidade de
Antonio Carlos a
São João Del Rei, inaugurada em 1881, por
Dom Pedro II. Mas tarde, já século XX, essa ferrovia se estende pelas vertentes do
São Francisco até o
Estado de Goiás, seguindo a velha trilha aberta por
Anhanguera, há dois séculos.
Com relação à história política a região foi palco, cenário e elenco de memoráveis lutas de caráter nacional, desde os primórdios do ciclo da mineração. O desfecho final da
Guerra dos Emboabas no triste e célebre "Capão da Traição", à beira do Rio das Mortes, em São José Del Rei (
Tiradentes). Com o desmembramento da Capitania de São Paulo e Minas e definição da fronteira entre elas, em 1720, quinze anos depois o governador de
São Paulo, Luiz de Mascarenhas tentou estender sua jurisdição até o município de
Campanha, no Sul de Minas. Graças à atuação firme da
Comarca do Rio das Mortes, o intento paulista não se realizou. No ocaso da mineração aluvial, São João e São José Del Rei participaram de forma efetiva da trama revolucionária da
Inconfidência Mineira, nas ações de
Joaquim José da Silva Xavier, Inácio Alvarenga Peixoto,
Bárbara Heliodora, Padre Carlos Correia de Toledo,
Resende Costa (pai e filho), Padre
José Custódio Dias. Em 1808, um grupo de cidadãos da
Comarca do Rio das Mortes assinou manifesto de apoio à elevação do
Brasil à sede da Monarquia Portuguesa com
D. João VI. Em 1822 os campo-vertenenses foram os primeiros de
Minas Gerais a publicarem um documento de adesão à Independência, citando
Montesquieu em defesa da liberdade dos cidadãos. Em 1833,
São João Del Rei foi sede do governo mineiro dando posse ao vice-presidente da província,
Bernardo Pereira de Vasconcelos, até que fosse debelada a sedição militar que, em
Ouro Preto, depusera o presidente Manuel Inácio de Melo e Souza.
Em 1842, os liberais ganharam as eleições sendo as bancadas de Minas e de São Paulo as mais expressivas.
D. Pedro II foi elevado à condição de maioridade para começar a governar. Imediatamente, premido pelas forças conservadoras dá o golpe e dissolve a Câmara dos Deputados e as Assembléias Provinciais. As forças liberais de São Paulo e Minas pegam em armas para exigir de
D. Pedro II a volta à normalidade e à legalidade. Os mineiros reuniram-se primeiramente em
Barbacena e foram-se organizando com a nomeação do presidente interino da Província. Em seguida transferiam o centro do movimento para
São João Del Rei. As demais câmaras da região como
Itapecerica,
Oliveira,
Tiradentes,
Barbacena e
Conselheiro Lafaiete aderiram-se imediatamente. O episódio mais cruento da revolta foi em
Conselheiro Lafaiete. Os soldados da
Guarda Nacional de
Queluz e os recrutas civis, em 26 de julho de 1842 venceram as tropas legalistas, entrincheiradas no adro da matriz de Nossa Senhora da Conceição. Quando partiram para
Santa Luzia para enfrentar o exército de
Duque de Caxias, todas as demais regiões de Minas estavam coesas com as câmaras do Campo das Vertentes. Padre Marinho narra com minúcia a forma como esses contatos e adesões foram conseguidos numa província tão ampla e de difícil acesso como
Minas Gerais.
No
Movimento Republicano Mineiro destaca-se principalmente a participação dos políticos de
Barbacena, a exemplo de
Antonio Carlos Ribeiro de Andrada que desde 1886 aderiu ao
Partido Republicano Mineiro. Salienta-se também a atuação do jornal
"O Mineiro", que circulava por toda a região trombeteando palavras de ordem do Movimento Republicano e promovendo eleição de deputados republicanos. Na vida política republicana a região tem uma história notável com participação de figuras proeminentes como
Francisco Sales, as famílias
Resende,
Andradas,
Bias Fortes e
Neves.
Referências Bibliográficas
BARBOSA, Waldemar de Almeida.
A decadência das minas e a fuga da mineração. Belo Horizonte: UFMG, 1971.
CARRATO, José Ferreira.
Igreja, Iluminismo e escolas mineiras colônias. São Paulo: Nacional, 1968.
CARVALHO, Daniel de.
Francisco Sales: um político de outros tempos. Rio de Janeiro: José Olympio, 1963.
COSTA, Joaquim Ribeiro.
Toponímia de Minas Gerais. Belo Horizonte: Imprensa Oficial, 1970.
MARINHO, José Antônio.
História do movimento político de 1842. Belo Horizonte: Itatiaia: São Paulo: USP, 1977.
MAWE, John.
Viagem ao interior do Brasil. Belo Horizonte: Imprensa Oficial, 1922.
ROCHA, José Joaquim da.
Memória histórica da capitania de Minas Gerais. Revista do Arquivo Público Mineiro. Ouro Preto, ano II, 1897.